domingo, 14 de outubro de 2012

Era inverno e eu tinha 16. Agora são 17 primaveras.

 Começou a chover agora e eu sabia que ela viria. "Chuva de verão" na primavera. Meu nariz me irritou e a temperatura caiu tão rápido que pude não só sentir o arrepio correndo pela minha espinha, como também vê-lo pontuando meu braço como se dissesse "vá botar um casaco!" em algum tipo de braille corporal. E então choveu. Eu estava esperando por isso.

 Descobri faz algum tempo que simpatizo com a chuva; gosto do barulho que ela faz na minha janela de alumínio quando está tudo quieto - como agora -, do cheiro ela traz e até do chiado que ela cria na paisagem quando eu olho pra um poste ou farol dos carros e vejo aqueles riscos de pingos e resquícios de cores.

 Gosto de pensar que isso tudo começou quando eu era menina menor-ainda (gosto porque procurar memórias antigas tendo só 17 anos não é tarefa fácil) e minha mãe me mandava tomar banho da primeira chuva de cada ano pra deixar tudo de ruim ir embora junto com as gotinhas que escorriam e secavam depois. Mas eu era só uma menina e, na época, isso tudo não passava de molecagem ou de um jeito rápido de limpar o melado que os doces de Ano Novo deixavam.

 Hoje, quando ela chega pra mim, sempre tenho a sensação de que um velho amigo veio me fazer uma visita. Um amigo com uma pontualidade questionável, é verdade, porque nunca chega quando eu chamo. É mais do tipo que espera um pouquinho pra aumentar a vontade e pegar de surpresa, mas ainda sim do tipo que a gente sempre pode contar. Seja naquele diazinho que a vontade é de fazer nada ou naquele calor que machuca, uns pinguinhos barulhentos sempre vão bem.

 Mas posso entender quem diz não gostar quando chove e molha o chão com terra e faz lama e suja o sapato que respinga na meia e molha a roupa, a cara e borra a maquiagem e estraga o penteado porque gente grande é assim mesmo: gosta de tudo nos conformes e sob controle. Mesmo assim saio em sua defesa: é precipitação de quem não a coloca nos planos.

 Qualquer que seja a causa dessa minha paixão, a verdade é que a chuva, com esse leva e traz, traz pra mim uma irônica sensação de renovação. Ouso comparar essa relação com um amigo que leva o outro pra uma bebedeira pra afogar as mágoas. A diferença é que ela não tem que me carregar e eu não tenho ressaca. A ressaca fica pro mar. Mas isso fica muito longe de mim...

Um comentário:

  1. Lindo, limpo e tão sincero. Parece você falando, sozinha... faz refletir. Ainda mais eu que cismei por muito tempo que verão deveria durar o ano inteiro. Agora to mais pra primavera. Chuva de vez em quando faz bem ;)
    uahuhaua, eu acho que saquei a metáfora, muito boa.

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